Apesar
de ser uma das divindades mais importantes e mais conhecidas no Egito
antigo desde por volta da V dinastia (2479 a 2322 a.C.,
aproximadamente), a deusa Ísis não foi titular de nenhum templo no
país dos faraós pelo menos até o século IV a.C. Ela somente era
venerada nos templos onde havia culto para Osíris e Hórus, seu
esposo e filho, respectivamente. Entretanto, no período posterior à
chegada de Alexandre Magno ao Egito, em 332 a.C., o culto de Ísis se
expandiu de tal forma que ultrapassou as fronteiras egípcias
chegando a diversas regiões no entorno do mar Mediterrâneo e
influenciou cultos posteriores, como é o caso do próprio
cristianismo, na figura da Virgem Maria.
Representando a encarnação de todos os aspectos femininos – filha, irmã, esposa dedicada, mãe zelosa, sacerdotisa, rainha, maga, grande deusa-mãe, rainha dos deuses e do universo – Ísis era apreciada, venerada e extremamente popular em todo o mundo greco-romano e também no mundo pós-romano. A partir do reinado do faraó Nectanebo I (por volta de 378-361 a.C.) começaram a surgir os primeiros santuários dedicados a Ísis, dos quais destaca-se o templo da ilha de Filae, no Alto Egito, onde a deusa foi cultuada até mesmo após a proibição dos cultos pagãos, promulgada pelo imperador romano Justiniano em 535 d.C., quando o Egito abraçou o cristianismo majoritariamente.
Representando a encarnação de todos os aspectos femininos – filha, irmã, esposa dedicada, mãe zelosa, sacerdotisa, rainha, maga, grande deusa-mãe, rainha dos deuses e do universo – Ísis era apreciada, venerada e extremamente popular em todo o mundo greco-romano e também no mundo pós-romano. A partir do reinado do faraó Nectanebo I (por volta de 378-361 a.C.) começaram a surgir os primeiros santuários dedicados a Ísis, dos quais destaca-se o templo da ilha de Filae, no Alto Egito, onde a deusa foi cultuada até mesmo após a proibição dos cultos pagãos, promulgada pelo imperador romano Justiniano em 535 d.C., quando o Egito abraçou o cristianismo majoritariamente.
Templo
do Filae, construído pelo faraó Nectanebo I em honra a deusa Ísis.
Seu
culto, simples e de fácil entendimento, apresentava-a como protótipo
da maternidade e enfatizava a contribuição de Ísis para o esforço
de civilizar a humanidade, visto que a deusa teria sido a responsável
por ensinar os homens a viverem em família, a moer o trigo e fazer o
pão. Também ministrara ensinamentos aos homens para que estes
aprendessem as técnicas da tecelagem e era responsável pela
elaboração de encantamentos que levavam à cura de quaisquer
padecimentos. Em muitas de suas estátuas, Ísis aparecia amamentando
o pequeno Hórus, que se sentava em seu colo, daí seu papel de
protetora das crianças. Por causa de todos estes atributos, os
gregos identificaram Ísis com suas deusas Deméter, Hera e Afrodite.
Ísis
e Hórus. Museu Imhotep, Sakara, Egito.
Na
época ptolomaica, a rainha Arsinoe II, irmã e esposa do faraó
Ptolomeu II Filadelfo (285-246 a.C.), foi identificada, após sua
morte, como a reencarnação da deusa Ísis. Entretanto o caso mais
famoso, dentro da mesma dinastia, foi o da assimilação de Ísis
pela rainha Cleópatra VII (51-30 a.C.). Quando, em 47 a.C., nasceu
seu filho Cesário, de sua união com o general romano Júlio César,
a rainha mandou cunhar moedas em que aparece representada qual Ísis,
segurando seu filho Hórus-Cesário. Em outra oportunidade, em 34
a.C., comemorando o triunfo de seu amante, o também general romano
Marco Antônio, na cidade de Alexandria sobre os armênios, Cleópatra
identificou-se como a "nova Ísis" e persuadiu Marco
Antônio de que ele encarnava o "novo Osíris", desta forma
poderiam reivindicar a herança do casal divino original, ou seja, o
próprio trono do Egito.
Já sob o domínio do Império Romano
o culto de Ísis difundiu-se pelas mais variadas regiões próximas
ao mar Mediterrâneo. Existiram templos em honra à deusa até mesmo
na península Ibérica. Neles havia um corpo sacerdotal próprio que
organizava os chamados "mistérios de Ísis", cerimônias
secretas das quais somente participavam os iniciados. Além disso,
grandiosas festividades eram realizadas para cultuar a deusa, como
procissões acompanhadas de abundantes oferendas de leite e água e
que contavam com fervorosa adesão popular.
As influências do culto de Ísis ao longo da história do Império Romano foram mais profundas do que normalmente imaginamos. Em particular no modo como os primeiros cristãos se apropriaram da iconografia da deusa para representar a Virgem Maria. A veneração da mãe de Jesus recebeu um forte impulso quando a partir de 312 d.C., pelo ato de tolerância promulgado pelo imperador Constantino, o cristianismo se converteu, pouco a pouco, em religião imperial, com a conseqüente conversão das massas pagãs do Império. Esta gente acostumada a milênios de culto à Grande Mãe, à deusa, etc. não podia aceitar sem mais o patriarcalismo judaico adotado pelo cristianismo primitivo. Não é de surpreender que tenha sido no Egito onde se originou a adoração de Maria sob o título de τεοτόκος – "aquela que espera o filho de Deus". Mais tarde, no Concílio de Éfeso (431 d.C.) esta designação egípcia foi convertida em dogma da Igreja. Como vemos foi no Egito, onde até ao início da era cristã Ísis (com o filho Hórus nos braços) fora adorada, onde se cristalizou o culto à Virgem Maria (com o menino Jesus nos braços). Ou melhor, onde a deusa Ísis se converteu na Virgem Maria. Parece então, que o destino de Ísis foi converter o cristianismo primitivo, descendente direto do judaísmo monoteísta patriarcal, numa religião sincrética.
Madonna
del Latte. Basílica da Santa Cruz. Florença, Itália.
É
interessante destacar a semelhança entre as várias imagens onde
Ísis aparece amamentando Hórus com as primeiras pinturas ou
esculturas cristãs representando a Virgem Maria. Também a figura do
Hórus criança possui um reflexo na iconografia do menino Jesus
quando este aparece com o dedo levado à boca. Com a proibição do
culto aos deuses pagãos houve uma gradual "transferência"
dos atributos de Ísis para a Virgem Maria, associando-a, também, à
fertilidade, à concepção sobrenatural, ao tratamento de doenças e
à proteção das crianças. Muitos templos cristãos, dedicados ao
culto da maternidade na figura de Maria e do menino Jesus, estão
localizados em áreas, onde, no passado, se ergueram locais de culto
a Ísis. O historiador Will Durant observou que "os
primitivos cristãos por vezes fizeram os seus cultos diante de
estátuas de Ísis amamentando o filho Hórus, vendo nelas uma outra
forma do nobre e antigo mito pelo qual a mulher (isto é, o princípio
feminino) é a criadora de todas as coisas, tornando-se por fim, a
'mãe de Deus'".
À
esquerda temos uma representação de Ísis e Hórus em uma placa
egípcia do séc. I que se encontra exposta no museu egípcio do
Cairo. À direita detalhe do quadro "Madonna e o Menino Jesus",
pintura de Lucas Cranach do séc. XVI. Podemos notar claramente a
influência da iconografia de Ísis na representação da Virgem
Maria e também de Hórus em relação a Jesus.
Referências bibliográficas:
· CASTEL, Elisa. Diccionario de la mitologia egípcia. Madrid: Aldebarán Ediciones, 1995.
· DURANT, Will. "Our Oriental Heritage". In: The Story of Civilization: volume 1. Norwalk: Easton Press, 1992, p. 201.
· MELLA, Federico A. Arborio. O Egito dos faraós: história, civilização, cultura. São Paulo: Hemus, 1998.
·
SALES, José das Candeias. As Divindades Egípcias: uma chave para a
compreensão do Egipto antigo. Lisboa: Editorial Estampa,
1999.
Fonte: Centro de Pesquisas da Antiguidade
Fonte: Centro de Pesquisas da Antiguidade